Estrangeiros no esporte universitário


O acolhimento, a gratidão e as preocupações com o futuro do país que, mesmo com muitos defeitos, virou lar.
por Ana Flávia Rodrigues

Trevor/Foto: Lilo Oliveira

A UFF é um espaço onde as multiplicidades de origens e histórias se encontram e fazem com que todos se sintam em casa. A universidade possui acordos de cooperação acadêmica com mais de 200 instituições pelo mundo e acolhe muitos daqueles que veem o Brasil como uma oportunidade. As atléticas auxiliam nesse papel de integração, tornando essas pessoas partes fundamentais dos times. 

“Se eu pudesse resumir o esporte universitário em uma palavra, seria ‘emoção’.” É assim que Doux Salem, congolês que estuda engenharia elétrica na UFF, descreve o que sente ao representar a atlética no judô. Ele contou que já está aqui há 3 anos e se sente feliz em fazer parte disso. 

Doux Salem/Foto: Arquivo pessoal

Já Trevor, futuro arquiteto ganês, disse que sempre foi muito extrovertido, mas a “barreira da língua” o deixou calado. Só que isso não durou muito tempo. Logo conheceu o capitão de basquete da AACS, Daniel Pinheiro, e entrou pro time. “Eu era muito tímido porque não dominava a língua portuguesa na época, mas, mesmo assim, eu me senti confortável pelo jeito que me acolheram.” Hoje, ele está bem integrado com os outros atletas e já se aventura em outros esportes. 

Kathie, que veio da Guatemala pra estudar Relações Internacionais, revela que jogava futebol durante o colégio, mas nunca se considerou boa. Os ‘Barões da UFF’ não aceitaram uma resposta negativa e, logo no dia da matrícula, pegaram o contato da guatemalteca e a colocaram no time. “Eu acredito que o esporte universitário me ajudou muito a acreditar mais em mim, me empoderou. Eu sempre falei ‘ah, eu sou muito burra com os pés e as mãos, não tenho coordenação, não nasci para o esporte.’ Eu tinha muito essa ideia na minha cabeça. E, aqui, as coisas foram diferentes.” 

Kathie/Foto: Arquivo pessoal

Por se sentirem em casa novamente, os atletas revelaram que o esporte também tem outras funções em suas vidas. “Eu ficava muito estressada na faculdade, não entendia um monte de coisa, era tudo novo pra mim. Chegava a hora do treino, eu me sentia tão bem! Era um momento em que eu me sentia muito relaxada, muito bem, muito em paz”, contou Kathie, que também reconhece a evolução de seu português pelas interações com os companheiros. Ela relembra os tempos de escola em que, se errasse durante o jogo, era julgada e não conseguia dar o seu máximo, “aqui, essa sensação mudou completamente. Eu fui aprendendo as coisas ao meu tempo e, agora, eu me sinto muito melhor”, desabafou. 

Doux Salem compartilha desse sentimento de alívio e complementa: “a gente sofre muito por ser estrangeiro, por estar longe da família. O esporte em si ajuda a gente a superar isso.” Para ele, trata-se de “uma outra forma de apoio, um lugar de fuga”. 

Dá pra perceber que o Brasil acabou se tornando uma casa para eles, que demonstram uma enorme preocupação com o futuro do país, sobretudo, no que tange ao meio ambiente e veem diferenças no cuidado que suas terras natais têm com ele. Kathie lamenta que, na Guatemala, a população não seja tão engajada com a questão ambiental e vê que, no Brasil, há mais debate e ações sobre o tema, principalmente, entre os jovens. Mas deixa claro: “acho que a gente deveria ter mais cuidado. Tem que melhorar.” Doux Salem lembra que o Congo tem a segunda maior floresta tropical do mundo e que grande parte dos congoleses fazem uso consciente da natureza para viverem. 

Trevor critica o “capitalismo infernal”, nas palavras dele, que quase destruiu vários rios importantes com atividades mineradoras. Ele diz, orgulhoso, que as pessoas de Gana tratam a natureza com muito respeito e cuidado, por entenderem que é uma força divina. Consciência quase ausente em muitos brasileiros, que, mais do que nunca, precisam se atentar e cuidar dessa riqueza que atrai tantos olhares e faz parte do sentimento acolhedor que o país emana

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