Lorena vive um período de instabilidade psicológica por conta da pandemia
Foto: Google
Por Giovana Rodrigues
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Mestranda em Mídia e Cotidiano da UFF (Universidade Federal Fluminense), Lorena Ruyz se programou para iniciar o estágio docente no primeiro semestre do ano. Até que, logo no início de março, tudo mudou abruptamente com a incidência da COVID-19 no país e um óbito suspeito em sua família.
Para a também publicitária, nada se manteve, exceto os problemas psicológicos, que foram inclusive agravados por conta da preocupação com amigos e familiares e da "falta de fazer longas caminhadas pela cidade". Com dificuldade de produzir em um contexto de tanta instabilidade, ela decidiu que a melhor alternativa seria deixar a qualificação para depois, e não aparenta desconforto algum em tocar no assunto. "Acho importante falar dessas coisas abertamente", relata de forma tranquila.
Hoje, a rotina de Lorena é diferente em todos os aspectos imagináveis. Ela fica em casa, mantém tudo o mais limpo possível, não recebe visitas, evita proximidade física com as pessoas, além do protocolo metódico de higiene que precisa fazer cada vez que coloca "o pé na rua". Mesmo com todo o trabalho necessário para preservar sua saúde, ela não demonstra hesitação em ajudar as pessoas próximas. A mestranda conta que se coloca à disposição para fazer as compras, lavar e levar para um tio de 78 anos que mora na zona rural. Esse é um momento de zelar pelo outro, respeitando sempre as limitações que o contexto traz. Afinal, o bem-estar de quem amamos, influencia o nosso também, e, por meio das atitudes e até dos pensamentos ansiosos, Lorena revela que, em seu íntimo, compactua com essa afirmação.
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Porém a preocupação, se excessiva, traz consigo uma enxurrada de pensamentos perturbadores. Essa não é uma realidade muito distante na vida de Lorena. Mas como poderia ser? Quando se tem um irmão que trabalha em hospital e uma madrinha, em uma portaria de prédio - sendo ambos parte do grupo de risco. É possível evitar a preocupação ao perder uma tia de forma inesperada e suspeita com o diagnóstico de "insuficiência respiratória aguda", conhecer pelo menos dez amigos que vivenciaram a morte de pessoas próximas e ter uma mãe que se sente sozinha por não pisar sequer na rua há três meses? Para tentar amenizar a sensação de sufocamento que tudo isso causa, a saída que Lorena encontra, é andar no quintal, já que as caminhadas pela cidade, que costumavam aliviar a tensão, não podem mais acontecer.
Como as horas exigidas do mestrado tinham sido efetuadas antes da pandemia, as aulas já não precisam mais ser assistidas e os compromissos são cumpridos remotamente. Lorena escreve artigos, desenvolve sua dissertação e participa de três grupos de pesquisa: LACCOPS (Laboratório de Investigação em Comunicação Comunitária e Publicidade Social), Dissemina: perspectivas afrocentradas de raça e gênero na comunicação e na cultura e ESC (Ética na Sociedade de Consumo). Todos eles ainda produzem mesmo no contexto atual. A publicitária, inclusive, ajudou recentemente a organizar uma fanzine - material específico para as necessidades locais - junto ao LACCOPS.
Oriunda de uma realidade de baixa renda, Lorena tem trabalhado como freelancer ocasionalmente para suprir a falta de uma bolsa de pesquisa. Por isso, sem negar sua história, ela demonstra bastante empatia e tristeza pela forma como a pandemia está afetando indivíduos socialmente desfavorecidos. "Nem todo mundo consegue ter acesso à internet ou equipamentos tecnológicos que permitam que a pessoa estude remotamente. Nem todo mundo consegue ter um cantinho tranquilo para poder estudar e segurança no lugar onde vive". Em seu âmago, ela deseja que esse grupo social possa acessar a universidade, porque sabe, por experiência própria, o quanto isso é uma chance com poder de alterar muitas narrativas. Mas "a ausência do Estado e de políticas públicas tendem a acirrar essa desigualdade", aponta transparecendo revolta.
A publicitária reconhece que a pandemia causou muitos impactos em sua vida. "Eu não consigo pensar em um único aspecto da minha rotina que não tenha sido afetado. Sejam os estudos, os trabalhos, a convivência familiar, a forma como eu me relaciono com o mundo, a alimentação, a prática de exercícios e os cuidados com a limpeza da casa, tudo mudou". Ainda assim, ela se considera uma pessoa privilegiada, porque, ao menos, tem a oportunidade de ficar em casa quase todos os dias, e quando a sensação de sufocamento vem, ela tem um quintal para aliviar o desconforto. Mesmo com todos os efeitos da solidão, o isolamento social é uma possibilidade para Lorena, enquanto para muitos, é uma realidade bem distante.
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