Novo Humano

Cotovelos que falam

Por Lucas Kelly


Foto: Google


Durante a pandemia da COVID-19, uma das principais medidas apresentadas pelas entidades de saúde foi a quarentena. Apesar de ser recomendado que a população permaneça em casa, nem sempre isso é possível. Sair, agora, exige adequação a um novo comportamento. Sem abraços, sem beijos, sem apertos de mãos. Os cotovelos que pareciam invisíveis, agora se tornaram aliados de uma batalha. De muitas formas, tudo mudou. Um "novo normal" é estabelecido no convívio.

Segundo a professora Dra. Olivia Von der Wied, coordenadora do laboratório CONATUS (Laboratório de Antropologia sobre Corpos, Naturezas e Sentidos - GAP/UFF), o novo coronavírus traz configurações significativas para a sociedade e para o  comportamento humano e afirma que a pandemia é uma consequência da difícil  inter-relação entre a ação humana e os fenômenos naturais e ambientais.

"A pandemia da Covid-19 explicita a complexidade dos entrelaçamentos entre sistemas ecológicos, sociais e econômicos na contemporaneidade. O vírus (e seus efeitos), desde o seu surgimento em um mercado de animais silvestres na cidade Wuhan na China, deve ser pensado enquanto realidade que é tanto biológica quanto social, que ganha contornos por meio de uma série de práticas onde estão envolvidos diferentes tipos de atores, humanos e não humanos, tais como políticas de saúde, mercados e sistemas econômicos, ambientes sociais, políticos" explica.
Ela esclarece que as mudanças do cenário atual - imersão virtual, adaptações na rotina, uso de máscaras e constante higienização das mãos -  trazem impactos na forma que estamos vivendo e sentindo esses dias.

Olívia acredita que as alterações que estão sendo realizadas para o combate ao novo coronavírus, precisam ser planejadas pensando na diversidade corporal existente incluindo, de maneira adequada, os deficientes físicos. "As novas técnicas corporais - o uso de máscaras e a evitação do toque - não são acessíveis na relação com a diversidade corporal das deficiências, temos problemas sérios de exclusão na implementação dessas técnicas. As máscaras, por exemplo, são um problema para pessoas surdas. Toda pessoa surda, falante ou não de LIBRAS, faz uso da leitura labial, seja como complemento, seja como necessidade vital para a comunicação. O uso indiscriminado de máscaras gera uma barreira comunicacional para a pessoa surda. A pessoa cega que precisa sair às ruas está mais vulnerável à contaminação, pelo uso que precisa fazer das mãos e do tato para reconhecimento dos ambientes ou como estratégia de locomoção. Pessoas usuárias de cadeiras de rodas também precisam estar constantemente com as mãos nos pneus, o que aumenta consideravelmente o risco de contaminação" ressalta. 

O laboratório CONATUS está organizando atividades com novos formatos no período de quarentena com a modalidade virtual. Contudo, conforme diz Olívia, diferentes problemas são apresentados nessas alterações, como, por exemplo, a exclusão digital. Muitos não possuem o acesso à internet e não conseguem participar dos eventos planejados. "A baixa qualidade de sinal de internet e a interrupção constante do serviço em diferentes bairros, é outro desafio que estamos atravessando. Além de uma nova modalidade de exaustão pelo uso excessivo das telas".

Uma das novas atividades que está sendo realizada pelo laboratório é o blog "Etnografismos: cartografias da pandemia". O projeto coletivo tem como finalidade incentivar a partilha de impressões, experiências e sentidos sobre o contexto atual. Aberto para todas as pessoas, o blog propõe agrupar textos, poesias, áudios, imagens sobre como as pessoas estão sentindo durante a pandemia do novo coronavírus. "Nos munimos de um conjunto aberto de ferramentas (conceitos, imagens, trechos literários, sensibilidades, materiais e grafismos) que nos convidam a reconquistar a liberdade de experimentação, mantendo ativa a escuta antropológica, povoando nosso campo de histórias, alimentando o fogo da criação de novos sentidos para o que hoje nos investe".




Para conhecer melhor o blog:
Caso deseje, envie o seu texto para o email: conatus.uff@gmail.com 






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