Estudantes de medicina relatam a realidade do internado durante a pandemia da Covid-19

De março de 2020 até janeiro deste ano, os internos do 11º período de medicina da UFF estavam com as atividades suspensas no Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP)

Por Ingrid Cury

Foto: A Tribuna

Cada vez mais próximos do CRM, os internos de medicina do Hospital Antônio Pedro (HUAP) foram informados, no dia 12 de março de 2020, sobre a interrupção das atividades presenciais no início do período por tempo indeterminado. 

O primeiro caso do novo coronavírus no Brasil foi divulgado em fevereiro de 2020, durante as folias de carnaval, e a primeira morte ocorreu em 17 de março. A Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou pandemia em 11 de março de 2020. Após o decreto oficial da OMS, a cidade de Niterói determinou o isolamento social e o fechamento dos estabelecimentos não essenciais.
 
Eduardo Esposti, 24 anos, estudante de medicina da UFF, acreditou que a paralisação, devido a covid-19, duraria em torno de 15 dias. Com o prolongamento do isolamento social, seu maior receio foi o atraso da conclusão de sua graduação, pois o processo entre a finalização, o CRM e a prova de residência, seriam feitos às pressas.

Camila Diuana, 24 anos, estudante de medicina da UFF, contou que após os internos serem informados sobre o fechamento do hospital universitário, sentiu alívio, devido ao receio e preocupação de serem contaminados pelo novo vírus.  

Na segunda semana de pandemia, com o crescimento do número de casos já confirmados da Covid-19 no estado do Rio de Janeiro, a Secretaria de Estado de Saúde (SES) abriu vagas para que profissionais e estudantes da área de saúde trabalhassem como voluntários na assistência de pacientes com a doença. Eduardo e Camila se candidataram, porém não foram convocados.

Segundo Eduardo, o hospital não liberou inicialmente o retorno da turma, somente os estudantes que já estavam no término do curso. De todo modo, os alunos puderam buscar um internato eletivo, fora do hospital Antônio Pedro.

“Foi quando eu fiquei quatro meses no CTI não-Covid do Hospital da Força Aérea do Galeão (HFAG). No início, achei que seria apenas um mês, mas foi se postergando. Aí, em janeiro de 2021 voltamos para o HUAP. Hoje, continuo estagiando no HFAG”, afirmou Eduardo.

Eduardo, além de ter estagiado no HFAG no período em que o internato estava parado, ingressou em outro estágio, no Hospital Federal do Andaraí (HFA), em agosto de 2020, onde atua até hoje na linha de frente. O estudante precisou ser vacinado e contou que, em alguns momentos, durante o plantão da emergência, foi mandado para o andar Covid dos pacientes transferidos de Manaus. Em relação a sua experiência em atuar na linha de frente, ele disse que foi muito difícil no início.

“Eram pacientes muitos diferentes. Eu olhava para o rosto do paciente e, às vezes, não condizia com os resultados dos exames médicos, aí eu pensava: meu Deus, isso é uma bomba relógio. E, algo que era mais raro de ser visto, que é ver um paciente tendo que ser pronado, que são 7 pessoas para virar um paciente intubado, passou a ser mais visto nas emergências.”, contou o estudante.

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Foto:Eduardo Esposti (Local: HFA)

Eduardo disse que, apesar do HUAP ter uma estrutura de melhor qualidade, comparado aos hospitais federais, o hospital universitário acabou fechando mais ambulatórios do que o Andaraí. Segundo ele, nos hospitais federais faltam medicações básicas e leitos, sendo possível presenciar pacientes internados por quatro dias em salas de rápido atendimento. Para o estudante, o fato dos pacientes sem a Covid-19 serem aconselhados a não ir ao hospital, é um agravamento para possíveis aglomerações futuras.

“Em ambos os lugares, tanto o HUAP e o Andaraí, eu vi muita gente falando que perdeu a atenção por eles ou que tinham consultas marcadas e foram desmarcadas. Os pacientes chegam em um estado mais complicado. Acho que isso é algo que vai ser muito visto por agora e mais para frente, os pacientes chegando mais graves pela falta de atendimento.”, relatou o interno de medicina.


Camila optou por não retornar ao estágio no Alberto Torres, quando convocaram para renovarem o vínculo. Disse que não se sentia segura, mesmo em uma área não-Covid. Escolheu aguardar a retomada no HUAP. Com o retorno do internato, todos os alunos tiveram que realizar um treinamento sobre o uso de equipamentos individuais, os EPI's. 


“Os professores ensinavam a gente a botar as máscaras corretamente, o capote, luvas, tudo que fosse necessário. Caso a gente tivesse que confrontar com uma situação de risco, mesmo os estudantes não sendo direcionados a essas áreas.”, afirmou Camila.


Segundo o diretor-executivo de emergências da OMS, Mike Ryan, o Brasil está vivendo uma tragédia pelo alto número de casos e mortes por Covid-19. Mesmo com o início da vacinação, em 17 de janeiro de 2021, as taxas continuam em crescimento, devido as aglomerações de festas de fim de ano e carnaval e a não-aplicação em massa.


Para a Camila, após esses três meses de internato em meio a pandemia, acostumou-se a usar máscara, ao novo modo de examinar e aos cuidados que devem ser tomados. Porém, tem sido uma perda muito grande para sua formação, já que muitas cirurgias eletivas foram canceladas. Disse também que, durante a vacinação no HUAP, houve uma greve de residentes, pois não estavam incluídos na lista de prioridades, mas, logo, foram reiterados.


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