Apesar de preconceito, trans e travestis tem mais espaço na mídia

Mesmo conquistando cada vez mais espaço na mídia, pessoas trans seguem sendo perseguidas na vida real

Por Ayam Fonseca 

“O Travas no Audiovisual, assim como o meu ingresso no cinema é uma ferramenta política para que outros corpos como o meu possam adentrar nesses espaços que eu consegui” é assim que Ivy, primeira trans negra a ingressar no curso de Cinema e Audiovisual da UFF, define o projeto o qual ela fundou.

Projetos encabeçados por trans crescem em números em diversas mídias enquanto vêm ganhando reconhecimento. Em junho, a Amazon Prime estreou “Manhãs de Setembro”, série estrelada pela atriz transexual Liniker. A série conta a história de Cassandra, uma mulher trans que recém conquistou sua independência, e que tem a vida virada de cabeça para baixo quando descobre que tem um filho, fruto de um relacionamento de dez anos atrás. 

Na área dos quadrinhos, foi lançado “Manual do Minotauro”, gibi da cartunista e chargista brasileira Laerte Coutinho, o lançamento da HQ foi um sucesso e no momento o gibi encontra-se em primeiro dos mais vendidos em 3 categorias diferentes na Amazon. Além disso, há também o talk show “TransMissão”, encabeçado pelas mulheres trans, Linn da Quebrada e Jup do Bairro. O programa estreou em 2019 no Canal Brasil e segue até hoje, já tendo entrevistado diversas personalidades de renome, inclusive outras pessoas trans. Em 2018, “Uma Mulher Fantástica” faz história ao ser o primeiro filme estrelado por uma pessoa trans a ganhar um Oscar, estampando por definitivo a face da atriz Daniela Vega na história do cinema.

Dentro da UFF não é diferente. Projetos como o TransUFF ajudam no combate ao preconceito contra os transexuais, ajudando a promover o debate sobre a comunidade. Além desse projeto existem outros, como o projeto “Travas no Audiovisual”, que visa aproximar trans e travestis da esfera do cinema, ensinando desde o mais básico como o roteiro, até a montagem e edição de um filme. O projeto é uma iniciativa da estudante do curso de cinema e audiovisual da UFF, Ivy. 

Foto: Retirada do Instagram do Travas no Audiovisual

Moradora de Niterói e de origem pernambucana, Ivy sempre teve o sonho de trabalhar com artes cênicas, porém sabia da dificuldade que enfrentaria devida a pouca oportunidade que atores negros recebem. Foi só no fim do ensino médio, quando descobriu o curso de cinema e audiovisual que ela percebeu que atuando como roteirista ou diretora, ela poderia criar papéis, tanto para ela enquanto atriz, quanto para outras pessoas que enfrentam os mesmos tipos de preconceito que ela. Em sua visão, o cinema é uma ferramenta política de extremo impacto, e a inclusão de corpos dissidentes no seu meio, é importante para revolucionar essa área tão elitista e preconceituosa.

O projeto “Travas no Audiovisual” nasce de uma insurgência sentida ao longo dos seus três primeiros períodos do curso. Sendo a única pessoa trans de sua turma, e ciente de que havia alcançado um espaço elitista, ela viu a necessidade de criar um meio para que mais transexuais pudessem ter acesso às ferramentas que o curso de cinema disponibiliza. 

Foto: Retirada do Instagram do Travas no Audiovisual

Ivy acredita que de fato travestis e pessoas trans têm ganhado mais espaço na mídia, porém ressalta que ainda é um espaço muito pequeno, ainda mais se comparado ao tanto que já foi falado e é discutido até hoje em relação à luta dos transexuais. Além disso, ela chama a atenção para o fato de que além de colocar pessoas de grupos minoritários à frente das câmeras, é necessário tê-las também por detrás delas, para poder expor suas ideias, visões e vivências. Por conta da pandemia de COVID-19 o projeto se encontra parado no momento, porém com planos de retorno após o fim da pandemia. 

Apesar das conquistas, o preconceito segue forte no Brasil. Recentemente, aqui em Niterói houve o caso de assassinato de Dandara, travesti que teria entre 45 e 50 anos. Ela foi assassinada a tiros na madrugada do dia 13 deste mês, e seu corpo foi encontrado perto da Baía de Guanabara. A vereadora de Niterói, Benny Briolly, se manifestou sobre o caso no twitter e informou que entrou em contato com a família de Dandara e que acompanharia o caso através da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. A investigação do caso segue nas mãos dos policiais da Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí (DHNSG). O Conselho LGBT Niterói disse em suas redes sociais que está buscando mais informações sobre o caso e cobrando a polícia para a resolução do crime.

Foto: Retirada do twitter

Nesta segunda-feira (16), houve um ato organizado pela GND (Grupo Diversidade Niterói) em memória de Dandara. Diversos movimentos como movimento estudantil e ONGs LGBTI marcaram presença no evento para poder expressar a sua revolta. A vereadora Benny Briolly também esteve no evento e se manifestou no seu Instagram. O protesto ocorreu na praça Juscelino Kubitschek, local onde o corpo de Dandara foi encontrado.

Foto: Retirada do instagram


No dia 5 de julho deste ano, a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transsexuais), soltou um boletim com dados que apresentam uma parcela dos números que auxiliam no entendimento de como tem funcionado a violência transfóbica no Brasil. De acordo com esses dados, 2020 foi o ano com o maior número de assassinatos contra trans e travestis, batendo o recorde de 175 casos de assassinatos de travestis e transsexuais. Já em 2021, entre janeiro e julho foram encontrados um total de 80 assassinatos, 33 tentativas de assassinato e 9 suicídios no 1º semestre do ano.


Comentários

  1. Texto excelente, Ayam!! Abordagem muito clara e emocionante.

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  2. Ayam, achei a matéria super necessária e atual. A gente precisar discutir o tema, ainda mais quando o preconceito está tão perto da gente. Gostei, também, da forma que você escreveu e adorei o lide de citação, começando já com um baque. Parabéns!

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