Com a chegada do mês de junho, se faz ainda mais importante a proteção de vidas LGBTQIA+ por meio de projetos sociais e políticas públicas.
Por Rafaela Marques
Foto 1: Fachada do Centro de Cidadania LGBTI+ Leste
Reprodução: Arquivo pessoal
O mês de junho é conhecido internacionalmente como o mês do Orgulho LGBTQIA+, mas do que se trata esse período? Para Lana Potiguara, de 25 anos, travesti e bissexual, junho é muito mais do que uma lembrança da luta pelo direito de amar, é pelo direito de existir. Com um histórico de violência contra pessoas LGBTQIA+ extenso, o Brasil é considerado o país que mais mata essa população no mundo.
Para entender a situação em que a comunidade LGBTQIA+ se encontra nos dias atuais, é preciso compreender como nasceu esse movimento. Em 1969, era comum que os policiais fizessem operações em bares gays de Nova York, agredindo e prendendo a todos que estivessem no local. Entretanto, no dia 28 de junho desse mesmo ano, o resultado da invasão foi diferente. Quando os policiais entraram no bar The Stonewall Inn, os clientes reagiram, causando uma rebelião que durou diversos dias.
Essa rebelião, hoje é conhecida como a Revolta de Stonewall, que se tornou um marco na luta pelos direitos da comunidade LGBTQIA+. Por essa razão, o dia 28 de junho, tornou-se o dia internacional do Orgulho LGBTQIA+ e o mês de junho passou a ser dedicado a homenagens e desfiles que relembram a importância da luta que começou em 1969. Mas esse foi só o primeiro passo.
Na época, a homossexualidade era classificada oficialmente como um transtorno mental, e foi apenas no dia 17 de maio de 1990, que a OMS removeu a homossexualidade de sua lista de doenças, dando mais um passo na luta pelos direitos de toda a comunidade.
Foto 2: Protesto durante a Revolta de Stonewall em 1969
Reprodução: Domínio Público
No Brasil, a população LGBTQIA+ conquistou diversos direitos básicos com o passar dos anos, como o direito ao casamento civil em 2013 e a adoção por casais do mesmo gênero em 2015, mas não é o suficiente. Segundo o Observatório de Mortes e Violência Contra LGBTI+, apenas em 2021, o Brasil teve pelo menos 311 mortes violentas de pessoas LGBTQIA+, com 285 homicídios e 26 suicídios. Isso contabiliza uma morte a cada 27 horas, e prova que ainda há muito a ser feito pela população no Brasil, que está há 13 anos no topo da lista dos países que mais matam pessoas trans, conforme mostram as pesquisas da Transgender Europe (TGEU), e é considerado o país que mais mata pessoas LGBTQIA+ no mundo, de acordo com dados da Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (ANTRA).
Políticas públicas eficientes são essenciais para a manutenção de uma democracia e dos direitos individuais e coletivos de qualquer grupo social. Mas quando se trata de grupos historicamente oprimidos, faz-se ainda mais necessário. “A sociedade não é projetada para nossos corpos, muitos de nós precisam de auxílio seja para moradia, trabalho ou para estudar”, disse Lana Potiguara. Para ela, políticas públicas são importantes para que pessoas em situação de vulnerabilidade tenham os direitos básicos da vida assegurados. Já para o estudante de pedagogia Saulo Quintanilha, é necessário pensar em inclusão para garantir que todos tenham seus direitos de ir e vir garantidos, “Políticas públicas de inclusão (por exemplo, cotas para pessoas trans) e projetos de conscientização para a população com leis e artigos didáticos. Tudo para termos equidade para as próximas gerações”.
Se existe o objetivo de tornar a sociedade um local mais seguro para todos, é preciso que os governantes atendam as demandas de cada movimento para além deste. Na comunidade LGBTQIA+, por exemplo, é preciso pensar em como a sobreposição de identidades sociais e sistemas relacionados de opressão afeta cada vivência, incluindo mulheres, pessoas pretas, indígenas e pessoas com deficiências (PCDs). Para este jovem que preferiu se manter anônimo, a LGBTfobia o atinge de formas distintas. “Nenhum lugar é seguro para qualquer grupo historicamente oprimido e quando uma pessoa é LGBT e PCD a opressão é pior em qualquer cidade e ambiente, mas infelizmente essa situação não é debatida e não é ouvida”. De acordo com o jovem, PCDs são sempre colocados no fim da fila de prioridades da sociedade, e precisam ser empoderados e protegidos desde cedo para que possam ter mais oportunidades no futuro.
Ainda que exista um déficit na proteção de pessoas LGBTQIA+ por parte das leis e políticas públicas, existem exceções. Em Niterói, o Centro de Cidadania LGBTI Leste, criado em 2012 como um dos equipamentos do projeto “Rio Sem LGBTfobia” do Estado do Rio de Janeiro, tem como objetivo o combate a LGBTfobia e o atendimento sócio-assistencial dessa população. Além disso, o projeto conta com o recebimento de demandas LGBTQIA+ do Disque-Cidadania de Direitos Humanos da cidade, e com estratégias relacionadas à educação e à segurança pública dessas pessoas.
Foto 3: Imagem de Divulgação do Disque Cidadania LGBT+
Reprodução: Facebook
“Niterói, é um território que, apesar do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) elevado, é bastante hostil para a população LGBTI+. Inclusive a pessoa que recebeu o patrono deste equipamento, que é o Alexandre Ivo, foi um caso de homofobia que ocorreu aqui no território bastante brutal. Então o patrono representa a função que esse equipamento cumpre no território, que é de ser um espaço que seja de referência à população LGBTI+ para acesso à inúmeras políticas assistenciais, e também para caso ocorra alguma situação de LGBTfobia, eles possam recorrer e saibam que vão ser bem ‘atendides’ e também vão ter os trâmites necessários realizados", afirmou o assistente social do Centro de Cidadania, Matheus de Paula Sousa, reforçando a importância de projetos como esse na cidade.
Além disso, o Centro realiza um trabalho essencial na garantia da cidadania, principalmente de pessoas trans e travestis, que são a maior parte do público do projeto, fazendo atendimentos com assistentes sociais, psicólogos e advogados com o objetivo de entender a demanda de cada indivíduo. Um dos motivos de maior procura pelo Centro, é pelo auxílio na retificação civil de nome e de gênero nos documentos e pela necessidade de acompanhamento psicológico, uma vez que, de acordo com Matheus, ser LGBTQIA+ no Brasil coloca esse nicho populacional em um sofrimento diferenciado do que é vivido por pessoas cis, sobretudo heterossexuais.
Do ponto de vista de Matheus, a dificuldade de trabalhar em um projeto como esse vai além do sucateamento por parte estatal. “Eu coloco uma dificuldade pessoal que é ter que lidar com um grau muito profundo de sofrimento e de situações muito graves. Você percebe um padrão de situação social grave em várias pessoas trans e travestis que a gente atende, e diz muito a respeito de uma LGBTfobia e uma transfobia estrutural.” Ele ressalta também a importância de escolher representantes que sejam ativos na luta contra a LGBTfobia, para que assim, a situação do Brasil em relação a essa população possa finalmente melhorar.
O mês do Orgulho LGBTQIA+, é portanto, uma lembrança de que é preciso mais do que campanhas publicitárias em junho, mas de políticas públicas e projetos sociais que ajam diretamente no combate à LGBTfobia no Brasil.
Super matéria!!!!!! Parabéns!!!
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