Fica, vai ter bolo: a importância dos movimentos estudantis para a democratização do espaço acadêmico

 Por Fernanda Nunes

Foto: Luiz Fernando/UFFantástica

Os corpos que ocupam as cadeiras dos diversos campus da UFF pelo Rio de Janeiro, carregam uma variedade de olhares sobre o que é viver a experiência universitária. Para Thaís, ex-aluna de Políticas Públicas (UFF de Angra dos Reis), o público que frequenta o ensino superior mudou e a academia não estava preparada  para isso.

No ano de 2019 o IBGE apontou que os negros são maioria nas universidades públicas, representando 50,3% — o que, claro, não diminui o fato de que a população negra e parda representa mais de 55% da população, o que significa que proporcionalmente ainda há uma sub-representação do grupo—  e em 2018, mais de 7 mil alunos ingressaram na UFF por meio das cotas etnicoraciais. Esses números são inéditos, mas devemos lembrar que esse tipo de cota só entrou em vigor depois de 195 anos desde a fundação da primeira universidade no Brasil, o que nos leva a considerar a afirmação de Thaís e a refletir se 17 anos (a partir da primeira universidade brasileira a implementar essa reserva de vagas) foram  realmente suficientes para a reformulação da estrutura do ambiente acadêmico.

“As ações afirmativas trouxeram mudanças significativas para a universidade ao mudarem a cara dela. Graças a política de cotas e ao REUNI, hoje temos muito mais pretos e pretas nos bancos das universidades, mas ainda temos muito o que avançar”, disse Moisés Bernardo, estudante de História e integrante do setor racial do Levante Popular da Juventude na UFF (Niterói).

Foto: Moises Bernardo

Os coletivos e movimentos universitários, como o Levante, são ferramentas utilizadas pelos estudantes para tornar o ambiente acadêmico mais acessível, democrático e inclusivo, apontando pautas que vão para além do campus, mas que também precisam ser resolvidas dentro deles.  “O Levante tem sido muito importante no meu processo de formação pois tenho tido vivências e contato com uma realidade que não tinha tido acesso até então”, conta, “Esse ano desenvolvemos várias ações de solidariedade em comunidades, distribuindo cestas básicas e produtos de higiene para as famílias em vulnerabilidade social durante a Pandemia. Sempre morei em cidade pequena e nunca tinha tido a oportunidade de me engajar e poder fazer a diferença na vida das pessoas. Com o Levante aprendi a ser mais solidário, empático e ter amor pelo povo brasileiro.”

Assim como Moisés, o estudante de jornalismo, Luís Fernando, também procura a melhoria dentro do espaço acadêmico e uma das formas que encontrou de lutar por um ambiente mais igualitário foi por meio da UFFantástica, uma torcida independente LGBTQIA+ da Atlética de Artes e Comunicação Social (AACS). 

Foto: Luiz Fernando/UFFantástica

Através da criação de um ambiente acolhedor, a UFFantástica permite que, assim como Luís Fernando, diversos alunos se sintam seguros e orgulhosos de serem quem são. “A gente vive em um país extremamente homofóbico e preconceituoso, que elegeu Jair Bolsonaro, um presidente explicitamente homofóbico. Ter esse espaço, ter esses coletivos que trabalham por mais representatividade LGBTQIA+ é essencial. A afirmação da identidade LGBTQIA+ em um país homofóbico é revolucionária”, diz o estudante, tendo a certeza de que o que se aprende dentro desse movimento e nas universidades públicas vão muito além da sala de aula, mas que ainda é preciso avançar em algumas áreas “Eu acho que quando a gente fala em inclusão das pessoas LGBTQIA+ dentro do ambiente universitário, eu acho que a gente tem que focar em um ponto, em uma parcela, que são as pessoas trans. Não que ainda não exista preconceito, existe, mas uma grande parcela [das pessoas] na universidade pública é gay, lésbica ou bi [...] é algo que de uma forma geral a gente já avançou bastante, enquanto a população trans não. Pessoas trans são a parcela mínima da universidade”.

No ano passado, a UFF criou uma vaga no programa de Pós-graduação para pessoas trans e travestis, mas a pesquisa feita pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) no ano anterior (2018), aponta que os homens e mulheres trans representavam apenas 0,1% de alunos nas Universidades Federais brasileiras, o que faz com que as chances desse grupo chegar até uma pós seja quase nula. 

Se encararmos esses números ao longo dos anos, realmente os alunos de antes não são os mesmos de hoje, mas organizações que surgem a partir da mobilização do corpo estudantil trabalham para que esses novos rostos se sintam pertencentes ao espaço acadêmico, tornando nossa universidade em um ambiente cada vez mais plural.


Comentários

  1. Adorei a matéria, foi muito completa em diversos aspectos, e manteve o foco na inclusão. A única coisa que talvez mudaria seria centralizar a matéria em um grupo social, e talvez conseguir uma fonte com um olhar de fora da uFFantástica, alguém que se sinta incluído no movimento também por causa dele.

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