O reluzir da medalha no esporte pode esconder a dor de um atleta
Por Caio Fagundes
Foto: Lionel Bonaventure / AFP
No meio esportivo, é notável a ligação entre as palavras "atleta" e "máquina", no qual o lado humano dos esportistas é negligenciado. Inclusive, atletas que atingem um desempenho satisfatório em situações de pressão extrema, possuem esse aspecto considerado como uma valência imprescindível. Em contrapartida, a dificuldade em lidar com esses momentos decisivos é tratada como fraqueza em diversos casos. As vaias na saída do estádio e a cobrança nas redes sociais por parte do público e da imprensa, parecem desconsiderar o bem-estar da mente. Nas Olimpíadas de Tóquio, realizada há algumas semanas, a discussão acerca da saúde mental dos atletas ganhou força através de duas das maiores atletas do mundo: a ginasta Simone Biles e a tenista Naomi Osaka.
Primeiramente, há de se dispensar comentários sobre a ginasta Simone Biles. A atleta americana possui apenas 24 anos de idade e em sua modalidade, é a mais premiada da história dos Estados Unidos. A partir desse contexto vitorioso, Biles foi uma das competidoras mais pressionadas pelos olhares de mais de 3 bilhões de espectadores ao redor do mundo. Durante a disputa da ginástica feminina por equipes, a americana obteve 13.766 de nota, sua pontuação mais baixa no salto Olímpico. Mesmo com a vaga conquistada para as finais, a atleta optou por não disputá-la. Em nota oficial, a atleta disse: "Depois da apresentação que fiz, simplesmente não queria continuar. Acho que a saúde mental é mais importante nos esportes nesse momento. Temos que proteger nossas mentes e nossos corpos e não apenas sair e fazer o que o mundo quer que façamos".
Em entrevista ao Blog Alô, Gragoatá!, a psicóloga Luiza Albuquerque Tavares comentou o caso: "A pressão sofrida por esses atletas pode causar diversos tipos de transtornos. Se pensarmos na rotina desses atletas, não é fácil lidar com perdas em competições, cobranças internas e externas. Biles demonstrou estar esgotada profissionalmente com excesso de cobranças e a pressão de ser perfeita porque todos já confiavam em seu potencial em ganhar mais uma medalha. Esse excesso de cobrança traz consigo uma expectativa e posteriormente, perfeccionismo que na maioria das vezes, a própria pessoa não consegue enxergar que está se cobrando tanto. Ela escolheu cuidar de si e isso é um ato de coragem. Para que eles [atletas] tenham um bom desenvolvimento a sua saúde mental precisa ser preservada."
Sob o mesmo ponto de vista, a tenista Naomi Osaka era a principal representante do esporte nessas Olimpíadas, mas acabou sendo eliminada de forma precoce. A tenista japonesa de apenas 23 anos é a número 2 do ranking mundial, uma das atletas mais bem pagas do mundo e a responsável por acender a pira olímpica na cerimônia de abertura. A jovem atleta costuma trazer à tona diversas pautas importantes, como a da depressão, com a qual ela lida desde 2018 e por isso,já passou por episódios complicados em sua carreira. Em maio, Naomi decidiu retirar-se de Roland Garros por estar atravessando um momento delicado em relação a sua saúde mental. A atleta chegou a ser multada por recusar participar de algumas coletivas.
Foto: GettyImages
Além de todos esses fatores, os atletas, no âmbito competitivo, muitas vezes são expostos a altas cargas de treino, é preciso também estar de olho na exaustão física, segundo a psicóloga: “O cansaço físico acaba gerando estresse psicológico. A síndrome de Burnout tem tudo a ver com isso. Trata- se esgotamento mental e físico muito relacionado com o trabalho em si. Muitas pessoas que não procuravam ajuda médica e psicológica, não sabiam que possuíam a síndrome e agora com toda essa repercussão estão buscando tratamento”, disse Luiza Albuquerque
A psicóloga falou também sobre a fama, dinheiro e exposição na mídia: "A depressão ainda é vista como um tabu. E é de extrema importância os famosos usarem a voz ativa e seguidores para conscientizar sobre tal. Como é o caso do Whinderson Nunes. Ninguém espera que uma pessoa realizada financeiramente possa ter depressão. Até porque ele parece ser feliz, né? Mas, na verdade, já parou para pensar que ele precisa demonstrar ser feliz pelo papel dele na sociedade? Ele também, soube o momento certo de parar e cuidar de si, esse é o momento de autocuidado. Para tratamento da depressão, é indicado a terapia e alguns casos, combinado com remédios. Além disso, a importância de exercícios físicos, boa alimentação, dormir bem e etc."
Em suma, o esporte segue levantando bandeiras importantes, dessa vez, trouxe os holofotes para um dos maiores tabus da atualidade. Simone Biles e Naomi Osaka são exemplos de coragem ao se pronunciar sobre o ocorrido mesmo enfrentando tamanha pressão. Medalha de ouro para elas.
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