Os desafios para o desenvolvimento do futebol feminino de base em Niterói

Mesmo sendo reconhecido como o país do futebol pelos seus feitos, o Brasil ainda é desigual de oportunidades entre a modalidade masculina e feminina.

Por Paulo Queiroz


Foto: Reprodução Twitter Mariana Fernandes


“A falta de escolinhas para futebol feminino atrasa o processo de formação de novas jogadoras.” É uma constatação de Mariana Fernandes, atleta sub-18 do Flamengo, que como outras adolescentes, busca superar as adversidades diárias para alcançar seu sonho de ser uma jogadora profissional. 

Niteroiense, Mariana jogou até os 14 anos com meninos. Passou por escolas de bairro e pelo “Trops”, uma escolinha licenciada do Botafogo, na cidade. Nesse tempo, a jovem relata que sofreu preconceito, não só de seus colegas, como também de adultos.

- No início, havia um estranhamento da parte deles, não passavam a bola pra mim e nem sempre me queriam em seus times, mas depois de me verem jogar, não faziam essa distinção. Além disso, o fato de eu ser menina sempre foi motivo de brincadeiras entre eles, quando eu driblava um deles, por exemplo, era motivo de muita zoação. A distinção no tratamento que eu recebia partia em sua maioria dos pais de adversários, que faziam muitos comentários machistas.

 Além de Mariana, esse cenário é visto com muitas outras jovens atletas. É uma realidade que poderia ser diferente, caso as garotas fossem direcionadas a jogarem entre si. Entretanto, Niterói, apesar de ter diversas equipes focadas em meninos, não apresenta nenhum projeto de desenvolvimento inteiramente  destinado para meninas, cabendo a elas irem a cidades vizinhas em busca de tal. 

- O fato de dar menos oportunidades às jovens promissoras e que amam a modalidade cria uma grande diferença na quantidade de meninas e meninos que jogam futebol - disse a jogadora.

No Rio de Janeiro, há alguns projetos voltados para essas crianças e adolescentes, que buscam jogar com outras iguais. É o caso da escola “Meninas do Guri”.


Foto: Reprodução Facebook Meninas do Guri


Sediado no bairro de Botafogo, o projeto foi criado em 2009 e surgiu como uma oportunidade, afirma o dono da escola, Pedro Coppelli. A intenção com o projeto, o qual já atendeu mais de 250 alunas e que já revelou atletas para times como Botafogo, Duque de Caxias e Barra da Tijuca, era de preservar a essência e identidade do futebol feminino, focando no lado social e educacional.

- Nós visamos uma interação entre as alunas. Aquelas que, de repente, não tenham uma educação digna em casa, ali naquele horário que estejam conosco, tentamos educá-las para socializarem e aprenderem a respeitar o próximo.

Embora o “Meninas do Guri” tenha várias meninas ativas participativamente, Pedro admite ainda haver uma certa dificuldade para montagem de turmas, se comparado ao masculino.

- O interesse no futebol feminino só cresce. Hoje, já é uma realidade, mas não é tão popular, devido ao preconceito. Não há o mesmo incentivo e investimento do masculino. Fica difícil se igualar. No feminino, nós precisamos fazer (divisão) em: nível iniciante, intermediário e avançado. Não é possível fechar turmas restringindo pela faixa etária, como é comum no masculino. Quando alguém nos procura, normalmente perguntamos se a pessoa já tem uma noção, se já jogou em algum lugar e há quanto tempo, para encaminharmos para uma aula experimental em determinado horário. 


Foto: Reprodução Facebook Meninas do Guri


Essa questão não é exclusiva do futebol amador. Ocorre da mesma forma no profissional. Há poucas subcategorias. No Flamengo, por exemplo, atletas de 14 anos jogam juntas com as de 18. Trata-se de uma diferença técnica perceptível e que atrapalha o nível de rendimento dos treinos e jogos, como afirma Mariana Fernandes.

- Eu joguei meu primeiro campeonato brasileiro Sub-18 com apenas 14 anos, e isso, ao mesmo tempo que me fez crescer (amadurecer mais rápido), foi algo que influenciou no meu desempenho durante os jogos, pela diferença corporal (tamanho e força) e tempo de treinamento, por exemplo. A falta de subcategorias faz com que as atletas tenham que dar um salto muito grande de uma equipe de base (com pouco tempo de preparação) para uma equipe profissional, que exige um nível bem mais alto. Isso tudo acaba fazendo com que a modalidade tenha um nível técnico e físico mais baixo, já que os treinamentos de alto rendimento começam muito tarde.

A atacante do Flamengo, que completará 17 anos neste mês de setembro, agora vive o que sempre almejou, todavia acredita que o trabalho de base à nível profissional, pelo país, pode ser ainda melhor.

- O trabalho do Flamengo é fenomenal. Jogar aqui nos possibilita viver a realidade do que é ser uma jogadora de futebol, realizando nosso sonho com a melhor estrutura possível. O futebol feminino vem crescendo cada vez mais e, realmente, é preciso dar tempo ao tempo, para que no futuro, colhamos frutos de todo esforço. Porém, acredito que com maiores investimentos, divulgação e valorização da modalidade no geral, o processo de fortalecimento do futebol feminino de base será mais acelerado e eficaz.

Apesar da geração de jogadoras consagradas como Cristiane e Formiga, além de uma das maiores jogadoras de todos os tempos, Marta, estar se aproximando do fim, a atual camisa 7 rubro-negra projeta um futuro animador para o futebol feminino.

 - Os clubes estão cada vez mais dando atenção para suas equipes de base e a quantidade de competições também vem aumentando. Acredito que, em questão de tempo, seremos uma potência no futebol feminino e espero que possamos conquistar grandes títulos.


Foto: Reprodução Paula Reis / Flamengo


Desenvolvimento de escola de futebol feminino em Niterói

O blog Alô, Gragoatá! buscou contato com a Secretaria Municipal de Esporte e Lazer de Niterói para obter informações sobre o desenvolvimento de possíveis escolas de futebol para meninas niteroienses, mas, até o fechamento desta matéria, não obteve retorno.

Para mais informações sobre o projeto “Meninas do Guri”, acesse:  https://bit.ly/2Vnps9o


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