Ponte De Pedra na Trilha Colonial do Parnit agora é Patrimônio Histórico de Niterói

O trabalho de restauração da paisagem da Ponte de Pedra, realizado pelos voluntários do PARNIT, que culminou no seu tombamento, joga luz sobre a riqueza histórica e cultural que Niterói abriga em seu território

Por Douglas Ribeiro


Foto: Reprodução do site da SECONSER


Tombada como Patrimônio Histórico, Cultural e Arquitetônico da cidade de Niterói em 20 de Julho, a Ponte de Pedra, localizada no Parnit (Parque Natural Municipal de Niterói), foi devolvida à população através do trabalho dos voluntários do Parque, que realizaram uma restauração na paisagem, e tornaram a Ponte, antes coberta de terra, visível novamente. Um convite para resgatar parte da História do município.


A Ponte está situada na Trilha Colonial do PARNIT e já era conhecida por antigos moradores e frequentadores das áreas de mata da cidade. Mas o acesso só foi recuperado por volta de 4 anos atrás, quando várias das trilhas, antes fechadas, foram reabertas por voluntários coordenados por Alex Faria Figueiredo, Diretor de Uso Público do Parnit. Conforme ele conta, alguns livros citam essa trilha como um “peabiru'', isto é, um caminho utilizado pelos indígenas antes mesmo da colonização. "Os portugueses sempre tiveram o hábito, quando da extinção dos índios, de usarem os peabirus como caminho, justamente, da sua ocupação de sesmarias. Então, tecnicamente, talvez seja um dos caminhos mais antigos em uso contínuo do município de Niterói, quiçá do Rio de  Janeiro”, disse Alex.


Sobre a associação entre a preservação ambiental e histórico-cultural, Alex afirma que “a gente tem que entender a dinâmica do local e amar o verde sabendo a importância do verde, sabendo a importância daquela árvore e qual sua função ecológica. Qual é a função ecológica dos animais que habitam ali.” E “temos que conhecer a História para conhecer a dinâmica do uso local, conhecer o ser humano que ali viveu.” Dessa forma, ruínas históricas como a Ponte de Pedra, auxiliam a entender como o território foi ocupado e utilizado ao longo do tempo.


Além de estar situado num caminho de herança indígena, a Ponte de Pedra resgata o passado colonial da cidade. Segundo informações divulgadas pela Prefeitura, a construção datada de 1830, foi realizada por negros escravizados e era passagem do circuito comercial dos ciclos de cana de açúcar e café. “Niterói tem todo um passado do Brasil Colonial, majoritariamente, que é desconhecido. Na verdade, algo que é inerente a toda cidade. Eu costumo dizer de forma crítica que o nosso complexo de vira-latas nos impede de conhecer e valorizar a história local, o que é trágico na minha opinião", afirma o diretor do Parnit.


“As provas mostram que além de suas praias e bairros com nomes indígenas, Niterói também foi construída, ao longo dos séculos, por mãos africanas escravizadas que não tiveram seus nomes registrados na história da cidade”, conta Jaçanã Lima, Líder do Movimento Negro Unificado de Niterói (MNU Niterói). Jaçanã recorda também de outro vestígio da História, situado no Parque. "Um caminho chamado de pé de moleque, que é constituído de pedras que se interligam até as antigas fazendas de cana de açúcar na região de Itaipu, onde alí passavam os carros de boi conduzidos pelos negros escravizados, com as riquezas extraídas daquele local." Ela afirma que “esse espaço é de muita dor, suor e luta dos que vieram antes de nós, mas sabemos extrair da dor o canto de esperança!” A líder do MNU declara que Niterói ainda “tem muito para desvendar sobre suas raízes indígenas e africanas''.


A iniciativa de revitalizar a Ponte partiu de um grupo de 5 voluntários do PARNIT. Ezequiel Vicente, Fábio Uzeda, Luciano Almeida, José Francisco e Lucas Vargas, que tomaram o projeto como uma “missão da quarentena”, conforme conta Alex Figueiredo, que também é Coordenador do Voluntariado. Durante os meses da restauração paisagística, também se juntou ao grupo, o doutor em História Social Henrique Barahona, pesquisador da ocupação histórica da região. Figueiredo destaca que hoje, “o voluntariado é algo quase inerente a todo o Parque.” “Os voluntários auxiliam no reflorestamento, na manutenção do reflorestamento, sinalização de trilhas” e há até mesmo aqueles que não frequentam as trilhas, mas observam o Parque, de suas janelas, e comunicam possíveis focos de incêndio. “Existe um vínculo afetivo.” Alex explica que o grupo de whatsapp alcança mais de 200 voluntários, e uma lista de transmissão, cerca de 80. Fora as páginas no Facebook e Instagram. Por lá você pode acompanhar o cotidiano do Parque e também encontrará informações caso deseje integrar o time de voluntários.


O diretor do Parnit afirma também sobre a importância de aguçar o interesse dos acadêmicos pelos objetos de pesquisa locais. “Todas as ruínas daquele complexo estão localizadas a cinco quilômetros da UFF, e 10 a 15 quilômetros da UERJ e UFRJ, fora as faculdades particulares, e as pessoas não fazem pesquisa aqui. Um dos motivos de botar essa questão aparente é justamente falar que temos história, temos objetos de pesquisa, temos potenciais teses de doutorado e mestrado aqui." Ele cita como exemplo o Morro da Penha, onde ocorreu a Batalha da Ponta da Armação. Figueiredo recorda que encontrou uma muralha onde "parece ser a posição da trincheira dos legalistas que bombardearam a ilha do Mocanguê, em 1893."


Nesse sentido, a própria Lei que garantiu o reconhecimento da Ponte como Patrimônio da cidade, abre caminho para que outras construções da região também sejam reconhecidas, conforme exposto no artigo 3º, onde fica explícito que o tombamento “se estende aos demais elementos de natureza histórica, cultural e arquitetônica presentes no PARNIT, os quais também deverão ser inventariados e registrados”. 


O Projeto de Lei foi elaborado pelo Vereador Leandro Portugal, em diálogo com os voluntários, com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Recursos Hídricos e Sustentabilidade (SMARHS) e com os administradores do PARNIT. O Vereador destaca que essa extensão no artigo 3º é “parte fundamental para expandir a preservação, através da valorização e conhecimento da história da cidade. Incentivando o ecoturismo que é uma das atividades que pode ajudar e muito na retomada econômica pós pandemia.”


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