Canoa Havaiana, Niterói e pandemia: adiamento do Campeonato Estadual traz reflexões acerca da relação do esporte com a cidade

 Sede do Campeonato Estadual de Canoa Havaiana de 2022, Niterói se vê obrigada a adiar o evento.


Por João Pedro Pereira


Foto 1: Praticantes de Canoa Havaiana na praia de Icaraí - Niterói

Reprodução: Instagram @soulvaaniteroi


Apesar da expectativa para as competições esportivas no início do ano, Niterói enfrenta uma nova explosão de casos de Covid e entra em estado de alerta. Um dos maiores indicadores da gravidade da situação, no âmbito esportivo, é o adiamento do Campeonato Estadual de Canoa Havaiana que seria realizado entre os dias 28 e 30 de janeiro na praia de São Francisco. Tido como um dos esportes de maior destaque no município, a Canoa Havaiana, ou va’a, como também é conhecida, encara incertezas diante de um cenário preocupante, dessa vez ocasionada pela variante Ômicron.


Porém, para compreender o cenário atual e o motivo pelo qual esse esporte é tão importante para a cidade, é necessário voltarmos um pouco no tempo.


Dos primórdios à modernidade


Como o próprio nome diz (Canoa Havaiana/Polinésia), o Havaí, e diversas outras ilhas polinésia, foram os locais responsáveis pelo início dessa prática pela necessidade dos habitantes locais de se locomoverem entre ilhas para a pesca e, até mesmo, obtenção de notícias. Nesse cenário, as canoas, feitas dos troncos ocos de árvores das ilhas, cumpriram um importante papel para a sobrevivência dos antigos polinésios, que passaram a enxergá-las não só como um meio de transporte, mas também como algo muito mais íntimo de sua cultura, ligado diretamente à espiritualidade do povo. As canoas, dependendo da ilha, apresentam características e significados diferentes, o que as tornava ainda mais parte de uma identidade cultural.


Séculos depois, a prática foi institucionalizada como esporte, ganhou diversas categorias e estilos conquistando milhares de adeptos ao redor do mundo. Atualmente a canoagem, esporte olímpico, é um dos reflexos mais populares dessa cultura milenar. As canoas ainda são um importante símbolo para a população havaiana, que enxerga nelas séculos de história e ancestralidade.


Características atuais


As canoas, hoje, são divididas em algumas categorias, cada uma com uma ou duas siglas, podendo comportar até 12 remadores (V12) em uma junção de duas canoas com espaço para 6 pessoas (OC6). Além disso, também existem canoas para 4 remadores (OC4), 3 (OC3 ou V3), 2 (OC2) e, é claro, 1 remador (OC1 ou V1). Fora a individual, nas demais categorias cada atleta tem um papel específico no deslocamento e velocidade da canoa, além de um capitão.


Como todo esporte de alto nível, a Canoa Havaiana exige muita dedicação,treino e paixão dos atletas, como pontuado por Anderson Carvalho da Silva, praticante e dono da página do Instagram Peixe News Oficial: “Para quem pratica [...], treinar todos os dias ou seguir uma planilha de treinos não é sacrifício, é amor ao esporte.


Foto 2: Atletas em uma Canoa OC6

Reprodução: site Aloha Spirit MÍDIA


No Brasil, algumas das principais competições de canoa havaiana disputadas são: Aloha Spirit, Brasileiro de Va’a e o Campeonato Estadual de Velocidade do RJ.


Niterói e a Canoa Havaiana

Foto 3:  Praticantes de Canoa Havaiana remando em frente ao MAC – Museu de Arte Contemporânea – Niterói

Reprodução: Instagram @soulvaaniteroi


O município, historicamente, possui um laço estreito com os esportes aquáticos, com destaque para aqueles praticados no mar, entre eles a Canoa Havaiana. Não à toa, a cidade é tida como um dos principais pólos nacionais do esporte, formador de diversos atletas e sede de eventos importantes, possuindo diversos clubes e atividades espalhadas pela orla. 


Uma das teorias dos motivos pelos quais a cidade tem laços tão estreitos com esse tipo de esporte remete bastante às origens polinésias. A tradição indígena seria a responsável já que os primeiros habitantes das terras posteriormente conhecidas como Niterói utilizavam embarcações feitas com madeiras das árvores para a locomoção e pesca na Baía de Guanabara. Sendo essa a principal causa ou não, fato é que a cidade é uma fábrica de talentos do esporte, com atletas de nível nacional e internacional.


E agora?


Niterói foi responsável por sediar a primeira etapa do Campeonato Estadual de 2021, competição que não ocorria desde 2019 devido à pandemia, e também foi definida como o palco para o Estadual deste ano. Porém, o adiamento deste evento mostra que a situação pandêmica ainda está longe de se estabilizar. Dayone Rossi, atleta e multicampeã de Va'a, que pretende disputar o estadual, reflete bem, em sua fala, a decepção dos atletas com a situação atual: “[Para] 2022 as expectativas eram de normalizar tudo. Porém, a primeira prova já foi adiada novamente por conta da nova onda de Covid e gripe. Espero que passe logo.”


Essa situação escancara dois problemas sociais muito graves: o negacionismo e o descuido de quem já se vacinou. O primeiro é velho conhecido do brasileiro desde o início da pandemia. Já o segundo é mais recente, agravado com a falta de políticas públicas e sanitárias mais eficazes nas festas de final de ano e com as pessoas que ainda não tomaram a dose de reforço.


Os amantes desse esporte em Niterói se perguntam “e agora?”. Agora é o momento da cidade se espelhar nas modalidades com mais de dois remadores, onde cada um precisa cumprir seu papel, trabalhar em equipe e ter consciência de seus atos para alcançar a vitória coletiva. Agora é o momento da cidade buscar inspiração em um dos seus esportes símbolos para superar mais esse período obscuro.


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