Diante da necessidade de conciliar os estudos acadêmicos com a maternidade, as mães da UFF apresentam as suas realidades.
Por Isabela Barboza
Foto 1: Mulher com criança no colo enquanto mexe no computador
Reprodução: Getty Images
Apesar do papel da mulher na sociedade brasileira ter sido visto como exclusivamente reprodutivo e doméstico até meados do século XX, o mundo evoluiu e, atualmente, é comum vermos mulheres buscando por educação superior e ocupando espaços educativos, como universidades. Contudo, a evolução precisa continuar, pois mesmo com a entrada das mulheres no ensino superior, as instituições carecem de acolhimento para as mulheres que possuem filhos. Desse modo, mães discentes na Universidade Federal Fluminense relatam dificuldades enfrentadas diariamente por quem precisa estudar e cumprir as demandas cobradas pela universidade, além de assumir a árdua tarefa que é cuidar de um filho.
Em relação a medidas institucionais, é importante destacar que foi só em 2019 que mães obtiveram o direito de entrar com seus filhos no Restaurante Universitário. Antes disso, muitas mulheres comiam do lado de fora com seus filhos, junto a cachorros e gatos de rua, em um ambiente inadequado para a alimentação. A mudança só ocorreu devido a organização do Coletivo Mães da UFF (CMUFF), junto à Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis, e causou incômodo, como mostra um comentário de 2019, divulgado pelo coletivo em sua página do Facebook, que diz: “[...] Entrar com bebê no refeitório, além de perigoso, é um incômodo para os que desejam almoçar sem tumulto”.
Apesar das adversidades, Camilla Cidade, presidente do CMUFF afirmou: “Sinto que aos poucos e com muita luta estamos sendo ouvidas e iniciamos a ver ações de bonificação para mães, fraldários, e gestores interessados em manter e formar as mães na UFF” e salienta a importância da organização “A rede que criamos a partir da ausência foi o próprio Coletivo. Só foi possível me formar na primeira graduação pois uma companheira de coletivo assumiu buscar meus filhos na escola e ficar com eles até a aula acabar por um semestre, assim eu fiz as obrigatórias noturnas que faltavam e pude concluir”.
Junto a isso, algumas vezes, as mães se sentem excluídas pelos próprios colegas. Demonstrando o despreparo da sociedade em compreender e lidar com a maternidade no meio acadêmico. “Muitas vezes fiz perguntas no grupo e nunca fui respondida. Atualmente, decidi ficar no meu silêncio”, expôs Roberta de Souza, aluna de Pedagogia, e segue: “A sensação que tenho é que estarei sempre pra trás. Desistir não é uma opção. Eles (docentes) entendem meu lado, mas estarei sempre pra trás. [...] Quero pertencer à faculdade”.
No âmbito das relações interpessoais entre professores e alunas, também existem problemas. “Já fui humilhada por um professor falando que não iria me liberar na licença maternidade [..] pois ‘se eu abri as pernas tinha que me virar para ir a faculdade’, frase falada enquanto eu ainda estava internada após uma crise de eclâmpsia que me causou coma, edema cerebral, fora vários problemas psiquiátricos”, disse Thainá Luz, aluna de Ciências Sociais da UFF e mãe da Analua. Contudo, ela não foi a única a ter experiências negativas com os docentes na Universidade.
Karen Quintes, estudante de Engenharia de Recursos Hídricos e do Meio Ambiente, relatou que sua bebê chorou muito durante um trabalho, com isso, ela acabou sendo chamada atenção: “[...] após minha apresentação, foi falado que, mesmo no período online, tínhamos que nos programar para assistir às aulas e não ter nenhum contratempo”. Andressa Quintes Cascardo, aluna de Pedagogia no campus de Angra dos Reis, teve uma experiência similar: “[...] ouvi de uma professora que entendia que eu era mãe, mas não poderia estender os prazos do trabalho e leitura de textos porque seria ‘injusto’ com a turma. Enfim, ela não entendia e estava me excluindo. E, novamente, eu me cobrando demais, acabei com minha saúde mental [...]”.
Contudo, também existem professores que acolhem e lutam para criar um ensino superior mais acessível para mães, como conta Indianara Reis, aluna de Jornalismo: “A Carla Baiense, coordenadora do curso de jornalismo, tem exercido um papel muito importante neste momento para mim. Ela buscou todas as possibilidades [...] para que eu permanecesse na universidade, não me deixou desistir em nenhum momento, desde editais para bolsas, moradia, creche, até fazer companhia para o Miguel (filho) nos momentos em que eu precisasse assistir aula. Os professores foram muito compreensivos conosco também. Conheci alunos que se ofereceram para me passar o conteúdo caso eu não conseguisse assistir à aula.”
Ainda há um longo caminho para a inclusão total das discentes que são mães. O CMUFF segue ativo, e sua reivindicação mais recente é permitir que crianças possam ficar nas Moradias Estudantis e que "[...](a mãe) tenha acesso garantido à creche e a todo serviço que a UFF possa oferecer para essa mãe e sua criança durante o processo de formação dela”.
Comentários
Postar um comentário