Exposição “Choro” no MAC: Leitura da ansiedade e mundo digital no período pandêmico

As obras de Antonio Kuschnir revelam mais uma face da arte: denunciar e revisitar reflexões sobre o uso massivo das tecnologias durante a pandemia. 


Por Sofia Miranda 


Foto 1: Imagem de Antonio Kuschnir, autor das obras. 

Reprodução: Divulgação - Facebook 



A tendência do julgamento no mundo digital, o agravamento dos transtornos mentais e o mau uso das tecnologias são fatos que já vêm sendo discutidos na sociedade. Todavia, nas 73 telas expostas no Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC), Antonio Kuschnir traz à debate a acentuação desses fenômenos à efeito da pandemia. 


Em pequenas e grandes telas pensadas e pinceladas pelo jovem artista Antonio Kuschnir, de 20 anos, estão impressas suas necessidades de entender e refletir sobre o cenário a que o mundo inteiro foi submetido nos últimos dois anos. 


Diferente do que pode-se pensar, as primeiras telas nasceram antes da pandemia, quando já estávamos em um clima social desfavorável, conforme alega o artista e estudante de Pintura da UFRJ: “Eu lembro que em setembro de 2018, o Museu Nacional pegou fogo, me deixou muito triste. Eu tinha uma relação pessoal com o museu. Quando isso aconteceu, eu desenhei pela primeira vez um rosto chorando que veio se tornar muito mais para frente uma das pinturas da exposição”. O artista enfatizou suas obras como uma composição que simboliza também a perda de outras culturas. 


Em suas retratações artísticas, o artista expressa questões pessoais e coletivas que se encontram simultaneamente. O “Choro” focaliza a vontade de explorar os sentimentos humanos e universais, que segundo Antonio, “Existem desde que o mundo é mundo, de tristeza, de dor, de infelicidade, e que podem surgir seja pela pandemia ou por questões pessoais nossas”.


Foto 2: Tela da série “Choro”, na imagem um rosto chorando.

Reprodução: Divulgação - Facebook 


Com o início da pandemia todos os problemas e sentimentos foram intensificados de forma que, segundo a Organização Pan Americana de Saúde, os transtornos mentais como ansiedade e depressão tiveram um aumento de 25% em sua prevalência. Uma série de fatores resulta nesses dados, como o isolamento social, desemprego, os lutos, a solidão e entre o público jovem, o uso exacerbado das redes sociais. 


Sendo uma jovem inclusa no mundo digital, a estudante de Engenharia Mecânica da UFRJ, Ana Luisa Simões Marques (19) afirmou já ter se afastado diversas vezes do celular para sentir-se melhor. Também declarou que o uso indevido das redes sociais pesou em sua saúde mental no início da pandemia. “Eu não me adaptei bem ao EAD e tinha a tendência de me comparar sempre com outras pessoas, via todo mundo aproveitando todo o tempo extra que nós ganhamos, para aprender algo. [...] eu entrei num espiral de autodepreciação por não estar usando esse tempo extra”. 


A angústia provocada pelos dispositivos tecnológicos são elementos amplamente explorados nas obras do jovem artista, que descreveu a intenção de uma de suas telas “Tem uma pintura de uma pessoa com uma espada no celular, como se estivesse matando o celular de raiva, quantas vezes chegaram para mim e falaram ‘’nossa, às vezes dá vontade mesmo”.


Foto 3: Imagem da tela da série “Choro”, uma pessoa chorando e apunhalando um celular com uma espada. 

Reprodução: Divulgação - Facebook 


Neste quesito, a influencer digital Bruna Pimenta (23), assume seus cuidados como criadora de conteúdo para que seu perfil seja um espaço mais saudável para seus seguidores. “Eu comecei a mostrar mais minha realidade nos stories, postar stories desarrumada a maioria do tempo. É revolucionário? Não tem nada de revolucionário nisso. Eu tento levar a vida real, sabe? Eu desarrumada no dia a dia, para a galera ver que eu não estou 100% todo dia, 100% arrumadinha, não estou todo dia maquiada, eu não ando todo dia com corretivo e cílios postiços na rua, eu posto o que eu sou, olheiras até a boca e o cabelo todo louco”.


O Instagram é a rede social mais nociva à saúde mental, segundo uma pesquisa realizada pela Royal Society for Public Health. Mesmo adotando medidas que preservem a saúde mental dos seus seguidores, a influenciadora e maquiadora Bruna Pimenta afirmou já ter recebido um relato de autossabotagem de uma seguidora, “Ela se comparou por inteiro, falou que queria ser magra como eu, ter a minha habilidade de se maquiar, queria ter o meu rosto, o meu corpo, o meu nariz afilado e aquilo me destruiu”.


Numa realidade em que 1 em cada 5 jovens estão apresentando sintomas de ansiedade, o uso excessivo dos dispositivos móveis causam também alterações no sono, irritabilidade e estresse. Conforme explica a psicóloga e professora Luciane Machado (52), “As pessoas podem acabar desenvolvendo uma espécie de dependência ou até a nomofobia, que é o medo de ficar desconectado”.

 

Mesmo imprimindo em sua última e central tela intitulada de “Apocalipse” tudo o que há de caos, Antonio Kuschnir relata que ainda tem esperança em tempos melhores e garante um trabalho que seja o antônimo do choro, assim como outros trabalhos já feitos pelo artista, que desenha e pinta desde sua infância. A mostra será aberta até o dia 26 de junho de 2022. O museu funciona de terça-feira a domingo, das 10 horas da manhã até às 18 horas da tarde.


Os ingressos valem R$ 12 (inteira) e R$ 6 (meia), vale para estudantes da rede particular de ensino, universitários, adultos acima de 60 anos e professores. Entrada gratuita para crianças abaixo de 7 anos, moradores de Niterói, estudantes da rede pública de ensino, responsáveis pelos grupos de alunos e visitantes de bicicleta. Às quartas-feiras a entrada é franca.


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