Como as mulheres encaram a objetificação de seus corpos e a presença dos padrões estéticos no cenário artístico.
Por Clarice Candido
Foto 1: Apresentação da atriz Gabrielly Sant´Anna no teatro
Reprodução: Instagram eugaby_ss
“A arte para mim significa liberdade. Eu demorei muito para estar no meio da arte, no meio da atuação. Hoje me sinto muito mais livre”. As palavras ditas pela atriz de 22 anos, Gabrielly Sant´Anna, denotam o quanto a atuação é uma forma de arte que pode ser libertadora e transformadora. Porém, quando se põe uma mulher no centro dos holofotes, esta liberdade pode estar mascarada de muito sofrimento e luta por direitos femininos. Diante de uma sociedade patriarcal que objetifica, padroniza e sexualiza, artistas contam suas experiências no cenário da arte e mostram que essa busca pela liberdade ainda se mostra árdua.
Entende-se que objetificar é o ato de tratar alguém como um objeto ou coisa. Ou seja, quem objetifica não está interessado nos valores, desejos ou intelecto do outro indivíduo, pois o encara como um objeto apenas sexual. As mulheres são as grandes afetadas pelo ato pois, segundo um estudo da doutora em Ciências Públicas Caroline Heldman, 96% das imagens relacionadas à objetificação sexual são de mulheres.
Ainda que as mulheres estejam conquistando espaço em âmbitos educacionais e trabalhistas, o homem continua assumindo papel principal na sociedade. Tendo o público alvo sendo o masculino, a arte será pautada na visão do homem em relação a mulher, num papel de submissão e extrema sexualização, uma vez que o objetivo é trazer prazer ao homem e, para isso, as mulheres precisam se colocar em lugares sexualizados e dentro dos padrões estéticos vigentes.
Assim, corpos pretos, gordos e periféricos se tornam constantemente desprivilegiados. “Ainda existe um paradigma sobre quais corpos ocupam esses espaços e são aceitos. Geralmente, os padrões de beleza e estética da atualidade são cobrados de forma veemente por boa parte das artistas, atrizes, modelos, cantoras, dançarinas, influenciadoras, jornalistas e apresentadoras”, contou Alessandra Monteiro de Castro, jornalista e mestra em Ciências Sociais pela PUC. Ela ainda afirma que a indústria lucra muito com a objetificação dos corpos, principalmente femininos.
A mídia e a indústria privilegiam mulheres brancas e magras, já que estão dentro do padrão, e por isso pouco se vê um protagonismo preto e/ou gordo na cultura. “Como mulher gorda, a gente escuta que ‘não é isso que estamos procurando’ ou ‘você não faz o perfil do personagem’, quando o perfil do personagem não tinha nem sido mencionado”, relatou Gabrielly.
Além da atriz, Lúcia Andréa de Castro Moreira, cantora apaixonada por música e que exerce o ofício há 39 anos, conta que também já sofreu estas pressões sociais por ser mulher e ser preta. “Todo mundo exige muito da gente (mulheres). Como andar, como se portar no palco, como se vestir... É muita exigência o tempo todo, então as pessoas às vezes não veem o nosso talento”. A cantora contou que acredita que possa ter perdido algum trabalho por ser negra e pela sua aparência.
Foto 2: Apresentação de Lúcia Andréa no Theatro Municipal
Reprodução: Instagram @andreabeat2
Pensando no cenário musical de grande escala nacional, a cantora Anitta, além de ser uma das maiores artistas brasileiras da atualidade, é um dos maiores alvos de crítica da mídia pelos seus vídeo clipes sensuais e por usar roupas curtas em seus shows desde 2010. Objetificada desde os primórdios de sua carreira, Anitta recebe julgamentos não apenas em relação ao trabalho, mas também ao seu estilo de vida.
O cantor Zé Neto, da dupla sertaneja com Cristiano, foi um dos que teceu críticas à cantora, visto que a artista teria feito uma tatuagem em uma região íntima do corpo. “A gente não precisa fazer tatuagem no 'toba' para mostrar se a gente está bem ou mal. A gente simplesmente vem aqui e canta”, disse o cantor durante uma apresentação em Mato Grosso no dia 14 de maio.
A fala do cantor sertanejo, que repercutiu nas redes sociais nas últimas semanas, espelha a visão pejorativa da sociedade em relação à Anitta, uma vez que não valida as conquistas dela como artista e justifica o sucesso da cantora apenas pelo seu corpo e não por intelecto ou talento. Percebe-se também que muitas outras artistas femininas como Luísa Sonza, Pocah e Ludmilla, as quais cantam majoritariamente funk, são julgadas pelas formas como expressam sua arte, enquanto artistas masculinos não são afetados por julgamentos equivalentes.
Foto 3: Tweet de Anitta em relação à polêmica
Reprodução: Twitter @Anitta
“A arte e a música são a minha vida. Eu vivo de música e a música significa tudo para mim”. Com a fala de Andréa, é possível identificar o quanto a arte é importante para as pessoas e, com a presença da objetificação e da padronização dos corpos femininos, uma forma de expressão se tornou uma camuflagem para autenticar visões de um feminino objetificado e sexualizado.
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