Por Lucas de Azevedo
Em 1999, Gabriel O Pensador entoou a frase "Futebol não se aprende na
Escola" em um dos versos da música "Brazuca". Nela, o compositor, em
meio a nuances estruturais da sociedade brasileira, conta a história de
dois irmãos de comunidade pobre e como o futebol faz a diferença na vida
de um deles, que segue carreira no esporte, enquanto o outro enfrenta a
realidade diária de boa parte da população da classe trabalhadora até que
haja um desfecho trágico. Em dissonância com as primeiras aspas, a
paixão nacional que se tornou o futebol chegou a níveis de matéria em
salas de aula, áreas de atuação e conteúdo de críticas sociais e
comportamentais, e no cotidiano de alunos e professores uffianos não é
diferente.
Com o avanço do jogo e sua importância até mesmo econômica para
diversos países, surgiu a necessidade de maior profissionalização do
futebol no Brasil e no Mundo. Diversos marcos históricos permeiam essa
linha do tempo e contribuem para a imagem que é observada hoje. No
Brasil, por exemplo, a obrigatoriedade de retirada de licenças na CBF é o
que habilita os presentes e futuros comandantes e comissários técnicos.
Ainda, aqueles que não têm trabalho prévio como jogadores devem
cursar graduação em Educação Física para concorrer à licença. E não para
por aí. Diversas áreas secundárias e terciárias ao jogo já fazem parte de
seu ecossistema, como o caso de correntes esportivas na Medicina,
Psicologia, Fisioterapia, Publicidade, no Jornalismo, Marketing e tantas
outras áreas.
A profissionalização e a postura requerida no mercado de trabalho
conflitam, por vezes, com a relação instintiva e emocional que os
torcedores demonstram, principalmente quando este vai fazer parte do
mercado esportivo. É o caso do Henrique, aluno de Jornalismo da UFF que
estagia no seu clube de coração, o Botafogo: "a visão de quem trabalha
acaba sempre sendo mais racional, tendo que lidar com a opinião do
público e conciliar disputas de interesses, visões diferentes de
determinado assunto. Tudo é muito bem pensado e planejado, mas o
futebol é dinâmico, sempre podem ocorrer imprevistos que demandam
atenção máxima".
Foto 1: Henrique fotografando treinos do Botafogo
Reprodução: https://www.instagram.com/p/Cp_VDdHraK0/
Quando perguntado qual a maior dificuldade que ele observa no seu
cotidiano, Henrique, que pretende continuar atuando na área, se manteve
no mesmo tópico do conflito entre profissão e torcida: "a maior
(dificuldade) de todas é a dissociação da figura de torcedor. Saber que
você passa a ser figura pública e suas ações agora são vistas e têm
grandes consequências. Além de perder um pouco do lado torcedor e
pensar mais como profissional".
Outra personagem uffiana que compartilha de experiências como essa é a
Marina. Aluna de Publicidade e Propaganda do IACS-UFF, ela é estagiária
de fotografia do time feminino de futebol do Fluminense e contou um
pouco da sua rotina como colaboradora do clube e como foi essa transição
de torcedora para funcionária da instituição que tanto ama: "minha visão
trabalhando no Fluminense é muito diferente da visão de torcedora. A
gente consegue ver os bastidores, a gente consegue entender como
funciona, realmente, o clube, sem aquele estrelismo que tem da pessoa
que torce, a gente entende as dificuldades, a gente entende toda a
questão que envolve gerir um clube de futebol. (...) É trabalho final de
semana, trabalho dia de semana, pode trabalhar de manhã, pode
trabalhar à noite, depende do que tiver que acontecer de importante
naquela semana para o clube".
Foto 2: Marina desempenhando seu trabalho em treinamento do Fluminense
Reprodução: https://www.instagram.com/p/Cqq1a26uhXR/
Apesar do amor intrínseco com o Fluminense, Marina não nega que o
trabalho apresenta dificuldades e nem tudo são flores: "parece que são
mil flores, trabalhar no seu time de coração, parece um sonho - e muitas
vezes realmente é - mas, tem muitas dificuldades, muitas! Às vezes, você
se estressa no trabalho por questões de convívio mesmo, e aqui é seu
trabalho, mas também é seu time. Se o Fluminense perde, você se frustra
duas vezes, como torcedora e como trabalhadora daquele lugar. Vai
influenciar no seu trabalho, vai influenciar no seu emocional. Por mais que
você trabalhe bem, quando você trabalha com futebol, os resultados das
partidas vão influenciar nos resultados do seu trabalho, querendo ou
não".
Diferentemente de Gabriel O Pensador, nesses casos pode se perceber um
encaixe entre futebol e educação, mesmo que não se compare com o
contexto da música de Brazuca e Zé Batalha no campo e no morro. Para
além disso, talvez o futebol não se aprenda na escola, mas é uma escola,
para tantos no Brasil e no Mundo e para os uffianos de hoje que serão
profissionais do esporte amanhã.
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